segunda-feira, 6 de julho de 2015

entre aspas 3

"acordo sem o contorno do teu rosto na minha almofada, sem o teu peito liso claro como um dia de vento, e começo a erguer a madrugada com as duas mãos que me deixaste, hesitante nos gestos, porque os meus olhos partiram nos teus.
e é assim que a noite chega, e dentro dela te procuro, encostado ao teu nome, pelas ruas álgidas onde tu não passas, a solidão aberta onde tu não passas.
meu amor, amor de uma breve madrugada de bandeiras, arranco a tua boca da minha e desfolho-a lentamente, até que outra boca - e sempre a tua boca - comece de novo a nascer a minha boca.
que posso eu fazer senão escutar o coração inseguro dos pássaros, encostar a face ao rosto lunar dos bêbados e perguntar o que aconteceu."

eugénio de andrade