quarta-feira, 26 de junho de 2013

o conto que não tem nada para contar

cresceu-lhe uma ruga no rosto. e aos poucos roubou-lhe todo o protagonismo da cara. tentou um creme que só lhe fez afundar mais a pele. tentou um remendo como se faz quando uma estrada tem buracos mas a ruga fez-se cova e a cova fez-se vale e o remendo acabou por se perder lá para o meio do buraco. acumulava-se-lhe lá o surro e o sal do suor. a ruga eram noites sem dormir temperadas a dor e comichão.
a ruga eram os olhares que o vergavam. era o cheiro daquele espaço por preencher. a ruga era ele. tirou-lhe o sabor da comida, as horas livres. Os sorrisos doíam e a pele esticada forçava-o a uma expressão feia. ela cresceu como tudo que é mau cresce. tirou-lhe um olho, depois o outro, depois o resto. dias depois era só um homem com uma fenda no lugar da cabeça. perdeu-se a imagem de si próprio. não se lembrava.

(uma convulsão ligeira - seguida de um líquido esquisito)

dobrou-se em dois para conter a dor. gritou. lá acabou por passar. depois sentou-se perto das escadas e esperou pelo final feliz

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